Por
que aprender inglês?
Cada
um tem seu motivo – ou motivos.
Um
deles certamente é “poder entender filmes e música”. Poder assistir a filmes, a
séries de TV sem se preocupar com as legendas é
motivação de muitos.
Mas
enquanto isto não é possível, e também porque entender 100% é uma tarefa
bastante desafiadora, as legendas fazem parte do dia-a-dia da maioria dos
brasileiros – estudantes ou não de língua inglesa.
Não
são poucos os problemas encontrados nas legendas. A qualidade das traduções feitas para filmes,
seriados e outros programas é frequentemente questionada. Não foge muito da
realidade, dizer que praticamente ninguém elogia o trabalho de tradução bem
feito após assistir a um filme ou a um episódio de série estrangeiro, mas que
expectadores percebem e se irritam com traduções mal feitas.
Confesso
que, como professora que sou, acabo sempre pensando em como utilizar esta ou
aquela cena de um determinado filme ou episódio nas minhas aulas. Não só
“procurando” erros de tradução, mas também observando saídas criativas para
situações difíceis no processo tradutório. Filmes e séries são material
riquíssimo para a sala de aula: coloquialismos, expressões idiomáticas, até
mesmo estruturas gramaticais podem ser ilustrados. Mas isso é tópico para outro
dia...
As
situações observadas englobam desde
erros mais grosseiros de tradução como, por exemplo, troca de números ou dias
da semana, até erros que, acreditamos, estão mais relacionados a questões
culturais.
Para entender melhor, pergunto: como se deve fazer
uma tradução? Palavra por palavra, onde o papel do tradutor se restringe a um
trabalho de codificação e recodificação,
ou seja, passa-se exatamente as palavras do texto em inglês (neste caso) para o
português? Será que funciona sempre? Ou talvez deva-se procurar na língua
portuguesa uma estrutura (frase) equivalente ao que encontra-se no texto
original (inglês)?
Veremos que, para um resultado mais “natural”, a
busca de equivalentes é de fato mais interessante.
Então, o que é necessário para uma boa tradução? Um
bom comando das duas línguas. Parece óbvio. Mas não basta.
Observe o seguinte exemplo. Em um seriado (confesso
que não consigo me lembro qual) uma personagem fala algo como:
“He called me a cow! “
“Ele me chamou de vaca.” Certo ou errado? ERRADO no
contexto. Cow, quando se refere a uma
mulher, significa gorda. Se o
tradutor quiser manter ao uso da expressão idiomática com a figura de um animal,
dirá “Ele me chamou de baleia.” Convenhamos, há uma grande diferença no sentido.
Este
exemplo ilustra a importância do conhecimento que o tradutor deve ter das duas
culturas em questão: ele
traduz uma realidade cultural, ou seja, aspectos pertencentes à cultura do
texto original terão que fazer sentido para o leitor do texto traduzido.
Mas há situações em que o trabalho do
tradutor é ainda mais desafiador, e às vezes é simplesmente impossível.
Celebrações de outras culturas talvez
merecessem uma nota de rodapé, o que, por motivos óbvios, não é possível em
legendagem. Halloween[i] ou Dia das Bruxas?. Hoje
nas séries de TV tem-se optado por usar o termo Halloween. Ótimo, já que o Halloween
não celebra bruxas! Pelo contexto e imagens o expectador entende que é um dia
em que as pessoas se fantasiam e que tem algo a ver com fantasmas, espíritos e
até bruxas.
Valentine’s
Day é realmente o
Dia dos Namorados? Não exatamente. No caso do Valentine’s Day (14 de
fevereiro), os tradutores têm optado por Dia dos Namorados. De certa forma fica
estranho porque nós celebramos este dia com namorado/a, esposo/a,
companheiro/a. Eles, não necessariamente. Pode-se ter um encontro (date) com
uma pessoa nesse dia, e esta será seu Valentine. Crianças fazem cartões de Happy Valentine e entregam a amigos,
pais, avós... Usar o nome em inglês é uma escolha do tradutor, mas certamente
evitaria certas situações bastante estranhas.
Às vezes, como já disse, a tradução
simplesmente não é possível. No desenho animado Procurando Nemo, a certa altura, os dois peixinhos Marlin e Dory
estão na superfície do mar sendo atacados por um pelicano. Dory exclama “Duck!”
e é respondida pelo amigo, “It’s not a
duck, it’s a pelican!” (“Pato!” “Não é um pato, é um pelicano!”) Na
realidade, trata-se de um trocadilho que só é possível em língua inglesa, pois
o verbo to duck significa abaixar-se, esquivar-se. O que ela realmente disse ao amigo,foi para que ele se
abaixasse e se protegesse do ataque do pássaro. Ela usou o imperativo de um
verbo; ele interpretou como um substantivo. Paciência! Não há o que se fazer.
Estes trocadilhos são bastante comuns em séries de comédias como Two and a half men, The big Bang theory,
por exemplo.
A criatividade do tradutor entra em
jogo para compensar um trocadilho por outro em local onde seja possível
fazê-lo.
Existem também situações em que a
imagem (filme) “atrapalha” a vida do tradutor. Pica-pau. Quem não se lembra de situações em que o pica-pau recebe
uma lata escrita “nuts”, abre, come
tudo, e depois todos os seus dentes se quebram? Lembram-se do que tem dentro da
lata? Não são “nozes” (como na tradução)ou qualquer “fruta seca, tipo amêndoas,
castanhas”. São porcas (de parafuso). Pois é. Nuts pode ser frutas secas (nozes) OU porcas de parafuso. E aí?
Como resolver a questão? Não dá. Paciência... Já que estamos falando de Pica-pau, quando ele faz alguém de bobo,
passa a perna em alguém, às vezes o personagem se transforma em um pirulito, no
qual está escrito “sucker”. Algo tipo
bobão, tolo. Por que um pirulito? “Sucker”
é um substantivo que realmente quer dizer tonto, bobão. Mas o verbo “suck” é “chupar (pirulito)” Portanto, o pirulito seria um “sucker”. Mais um exemplo de trocadilho. Outra
situação do tipo “deixa prá lá...” Se não se lembram, assistam. É bastante
frequente.
O tradutor ainda se depara com
situações que a grande maioria dos expectadores desconhece. Uma é da censura.
É. É verdade. Há censura interna. Há uma lista de termos que simplesmente não
podem ser usados. Um canal (ou editora) pode aceitar´”traseiro”, mas não
“bunda”, por exemplo... Isso tira o “colorido” de algumas comédias. Para se
referir a esta parte do corpo temos várias palavras possíveis com bumbum,
nádegas e sabe-se lá quantas mais. E são usadas em contextos bem distintos: com
uma criança, em uma consulta médica, entre namorados.... Se posso usar só um ou
dois... Séries com piadas mais “picantes” como “Two and a Half Men” e “Sex and
the City” sofrem mais com isso. Mas é verdade também que a palavra “suja”, o
palavrão ou o xingamento escritos são mais fortes que os falados, o que interfere
no trabalho de tradução, principalmente quando destina-se à televisão.
Uma particularidade do trabalho do
tradutor de legendas é o espaço na tela e o tempo que leva-se para ler. Tomemos
filmes do diretor Woody Allen. Os personagens dele falam MUUUIIITO. Não há como
se colocar na tela tudo que eles falam. Cobriria metade da tela e ainda não
daria tempo de ler. Outro exemplo é a série Gilmore
Girls. Mãe e filha são verborrágicas. O jeito é “resumir”: pegar a ideia
geral e reescrever de modo que caiba nas duas linhas e no tempo adequado.
As
condições adversas como baixos salários, prazos absurdos, originais às vezes de péssima qualidade; e,
finalmente, o pouco treinamento dos tradutores, tendem a resultar em traduções
de baixa qualidade. Tenho, no entanto, observado uma melhora na qualidade.
Ainda há erros. Alguns absurdos. Mas há também saídas criativas para situações
difíceis.
Agora,
convenhamos, nada substitui o original... keep
on studying!
[i]
Halloween
(um diminutivo de All Hallows 'Evening) , também
conhecido como All Hallows' Eve, é um feriado anual observado em
31 de outubro, a noite antes do Dia de Todos os Santos. De
acordo com alguns estudiosos,a celebração incorpora as tradições dos festivais
de colheita pagãos e festivais em honra dos mortos de origm
celta. Atividades típicas incluem trick-or-treating(crainças
fantasiadas vão de casa em casa pedindo doces), festas a fantasia, jack-o'-lanterns
(morangas com olhos e bocas recortados iluminados por vela), fogueiras ,
atrações mal-assombradas, contar histórias assustadoras e assistir a
filmes de terror.